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Leonid Afremov |
Então fiquei assim: nua.
Não que eu tenha tirado a roupa, mas o escudo.
Tua voz espalhou pelo meu corpo naufragado o espanto.
Passiva e equilibrada,
olhei-me de novo no espelho partido.
Estava oco.
Sem imagem refletida.
Nem a velha imagem cubista. Nada.
Naquela noite inventei um amor no meu sonho.
Um amor de frases que li e ouvi, mas nada era meu.
Então abri a concha para ouvir tua voz,
que vinha de um tempo longe,
de um lugar que não existe,
entre ferrugem e musgo.
Tua voz trouxe uma canção que falava de amor.
Entre porto e naufrágio, tu procuravas o norte,
embalado pelo (en)canto da tua sereia.
E tu eras também sereia nos meus ouvidos.
Oferecias um ritmo sincero, que entregava o CÉU
e a esperança num canto de amor.
A melodia me tomou para um horizonte que chorava
a solidão nas frestas.
Queria também te resgatar,
mas o manto das estrelas me feria como punhal.
Não me joguei no teu abismo,
mas passeei no teu sonho.
E acordei comovida.
Solange Firmino