segunda-feira, dezembro 19, 2016

Contrariemos os desencontros


"Não vejo um oásis, porém / Vejo o universo."
Juliana Aguiar


A poesia de Juliana Aguiar, que resolveu se aventurar pelo terreno fértil e sinuoso da poesia, me comoveu. É uma poesia elegante, inventiva e modesta. E convincente na lucidez com que se utiliza das palavras muitas vezes gastas pelo uso. 
Dividido em partes que são Encontros, Desencontros, Diversencontros e Contra-rimemos, a poeta não quer fazer uma interpretação crua da vida e do amor, mas, sobretudo, traz um ponto de vista de quem aprecia poesia e está em constante contato e aprendizado da arte literária.


Encontros


O teor subjetivo da poesia de Juliana Aguiar não significa um enclausuramento em si mesmo, ela quer ir ao encontro do amor e da vida. O poema é isso, o deslumbramento não-explicado que nos transforma. A arte não vai explicar a força da gravidade, ela simplesmente vai ser aquilo que o ser humano quer expressar. E quando é o amor, não precisa de mais nada:

Tudo o que emito / reflete / no seu olhar.


O poema afirma sem susto a importância da poesia para o sentido da vida. É o apelo à vida, que não existiria sem poesia.

Sem poesia nada existiria / nada cairia, impediria, faria / sentido (des)explicar.


Desencontros


Desculpa, me despedaço: / um pedaço é seu / e o outro também o é; / o que eu faço?


Também há uma poesia objetiva, extraída de circunstâncias, reverenciando uma linguagem concisa, para além do espontaneísmo sugerido, constituindo, pois, nos jogos da linguagem, uma sintaxe que dá forma a um mosaico de referências, uma leitura nada inocente por trás da aparente fragilidade dos versos.


Fidelidade é mais que companhia; / soneto, mais que poesia. / sonhar não é realizar.

A poesia é um prazer que fere com doçura.

Quem diria? / a melhor poesia / é fruto da pior agonia.

Todo dia, a mesma sina / acordar, feliz estar / bocejar e seguir a vida.



Diversencontros



Deparamo-nos, aqui, com a poesia tranquilizadora, o sujeito questionador do seu próprio dizer poético e da capacidade de condensar o máximo da vida em mínimos instantes de poesia, e não há palavras que possam expressar esse sentimento:

A vida é linda! / É (?) tão linda / que nem tenho palavras / para me expressar.


Tais poemas valorizam o aparentemente trivial, e captam instantes de um mundo objetivo e exterior, onde o sujeito lírico encontra-se, muitas vezes, desejoso de uma leveza. Por vezes, finge uma ausência inocente.


Oh! Me cortei / não sei se foram nas palavras / ou no avalanche de emoções / que veio de vez.

Se são sonhos, / não os tornem demônios; / se são rios, / não faça desvios

sofro de insônia / e o sono me extravasa.



Está bem claro que o fazer poético limitado a estilos, escolas literárias, tudo que poderia aprisionar a liberdade de expressão do artista é rejeitado. O sujeito lírico se contenta em ser apenas poeta e escrever o que sente.


Bem cuidada a forma, / assimilo-me ao Parnasianismo; / Romantismo, pela emoção. / escrever o que sinto sempre foi a minha paixão.


O conhecimento surge como um artifício para sair do estado de ingenuidade, para o sujeito lírico, pois aprender com os erros é fundamental:


Naquela rua tinha uma pedra, / na qual um dia eu tropecei; / quem não aprende com o erro / novamente erra. / nunca mais naquela rua passei.


O centro pode estar em toda a parte, não há um sentido único para nada.


Não vejo um oásis, porém / vejo o universo.




Contra-rimemos


Como uma criança que acabou de conhecer as palavras, o sujeito lírico brinca, vê que pode brincar com as sílabas, fazê-las suas. Há um jogo de linguagens em toda a obra.


Não precisa ser céptico para ser poético / não precisa de ser infinito para perdurar.

Seja sempre meu sol / e não me sol-te.

Se flor, / não volte; / desabroche.

Assim, o sujeito, quando se assume perdido, se esconde na própria linguagem, fazendo dela um lugar onde se pronuncia.

Mãos / que nunca encontrei / tenho um livre arbítrio / que arbitrar livremente não sei.


Solange Firmino

CONTRARIEMOS OS DESENCONTROS
Autora: Juliana Aguiar
Editora: Multifoco
Ano: 2016

Páginas: 62

Um comentário:

Graça Pires disse...

Gostei do que disseste do livro de Juliana Aguiar. Parece-me ser excelente. Que tenha sucesso no percurso com os leitores.
Um beijo, minha Amiga.